quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Por que assim, tão fragmentada?

Fragmentos do meu eu escapam do meu corpo sem o meu consentimento. Não sei denominá-los, mas eles existem e estão assim, a pular de mim para o outro, de mim para a tela, de mim para o caderno, de mim para o universo todo. Quase ninguém os vê: apenas os clarividentes são capazes de manter algum contato com eles. Ops. Cuidado aí. Você pode ser atingido por um fragmento a qualquer momento. Eu não tenho um eu. Um centro assim, estável. Uma identidade, assim, com contornos bem definidos. Quem tem, hoje em dia? [Ufa, sou normal].

Ufa, sou normal. Mas acho que nunca conseguirei me acostumar a essa normalidade. Todos compartilhamos dela, certo? Afinal, quem hoje é uma página intacta? Todas as pessoas que eu conheço são assim: recortes e colagens. O andar da modelo x, a inteligência da professora y, a sensibilidade da escritora c, o sexo do filme s, a valentia do protagonista h.

Os fragmentos alheios também pulam em mim, sem minha permissão. Depois dessa permissividade toda, quem é capaz de dizer não aos fragmentos? Eles vêm de todas as partes do mundo, canalizados, transformados em energia: meus olhos captam e, por simbiose, sou alimentada a cada segundo.

A humanidade é um bando de revistas do mês passado. Picotadas. Ficou difícil de ler o mundo assim.

Por que assim, tão feia?

Não olha pra mim, putamerda. Hoje eu tô vermelha, e isso significa: colérica. É de se respeitar alguém que, por pelo menos cinco dias, perde uma quantidade razoável de sangue.

Todos vocês sabem que eu não sou mulherzinha. Batom na boca, brinco na orelha, berenguendém no braço, salto alto: aff. Não tenho a mínima paciência para essa frescurite crônica. A aguda até que me bate algumas vezes, pois acordar com essa cara amassada, caríssimos, dói. Daí explica o gloss e o lápis no olho: para disfarçar a cara de lagartixa.

Não olha pra mim. Passei mais de 10 minutos tentando arrumar a franja, que não decide se fica no meio, se fica de lado. Hoje ela decidiu acordar mau-humorada, com crise de existência. Tive de prendê-la para que ela não me fizesse passar vergonha.

Tá olhando o quê, hein? Meu 1kg a mais está pesando muito na minha consciência. Eu olho no espelho e pá: não tenho a barriguinha invejável das saradinhas da academia. Olho novamente e pá: não tenho a bunda das dançarinas da TV de domingo. De novo e pá: não tenho tetões de atriz pornô. Mais uma olhadinha e tóin: meus cabelos não se parecem com os comerciais.

Definitivamente. Hoje eu não deveria ter levantado da cama. Cama? Que cama? [piada interna].